Pesquisadores da Universidade Federal de Sergipe (UFS) conseguiram
reunir evidências científicas robustas para responder a controvérsia sobre o
uso clínico da hidroxicloroquina para a prevenção e o tratamento da covid-19. O
estudo de revisão sistemática com meta-análise confirmou que o remédio
antimalárico não funciona contra o novo coronavírus. O resultado da pesquisa foi
publicado no último sábado, 28, na revista médica The Lance Regional
Health, uma das mais prestigiadas do mundo.
A publicação na edição regional da revista nas Américas busca sintetizar
as principais evidências sobre a eficácia e a segurança do medicamento como
profilaxia pré e pós-exposição e no tratamento de pacientes. Isto é, antes e
depois da exposição ao novo vírus respiratório bem como para tratar pacientes
hospitalizados ou não com a infecção.
Liderada pelo professor do Departamento de Educação em Saúde e chefe do
Laboratório de Patologia Investigativa da UFS, Paulo Ricardo Martins Filho, a
pesquisa explora as principais questões acerca da possibilidade de
reaproveitamento do fármaco para a covid-19 devido à sua atividade
antiviral in vitro contra o SARS-CoV-2.
“Existem muitas polêmicas ainda em relação ao uso da hidroxicloroquina
para covid-19. Então, resolvemos fazer uma revisão sistemática com
meta-análise, que busca e avalia criticamente a literatura existente. Uma
revisão bem desenhada consegue fornecer a melhor evidência científica disponível
em relação a uma determinada questão, sendo muito importante, por exemplo, para
tomada de decisão em saúde”, explica Martins.
Na revisão sistemática, os pesquisadores identificaram 2.871 registros
de estudos a respeito do uso da hidroxicloroquina para prevenir e tratar a
covid-19, no período de 1º de janeiro de 2020 a 17 de maio de 2021. As buscas
sobre o tema foram realizadas nas bases de dados do PubMed, Web of
Science, Embase, Lilacs, ClinicalTrials e medRxiv.
“Fizemos uma busca muito abrangente na literatura médica. Foram várias
bases de dados consultadas, repositórios de preprints, incluindo aqueles
estudos que ainda não tiveram a avaliação feita por pares. Essa meta-análise
acaba sendo a mais completa, até então, em relação à eficácia e segurança do
fármaco”, ressalta o professor.
O próximo passo da pesquisa se dedicou a filtrar os registros,
considerando como critérios de inclusão: a população de estudo (indivíduos com
alto risco de exposição ao SARS-CoV-2 e contato próximo com um caso positivo ou
suspeito; pacientes internados e não internados); o grupo de intervenção
(hidroxicloroquina); o grupo de comparação (placebo); os desfechos clínicos
(incidência da infecção, necessidade de hospitalização, tempo de internação,
necessidade de ventilação mecânica invasiva, óbitos e eventos adversos); e o
tipo de estudo (ensaios randomizados cegos e controlados por placebo).
Com essa triagem, de quase 3 mil estudos, apenas 14 ensaios clínicos
randomizados cegos e controlados por placebo foram selecionados para a
meta-análise. Neste tipo de estudo, um grupo de indivíduos faz uso da terapia
ou exposição, sendo acompanhado por outro grupo que não a utiliza. A divisão
dos participantes em cada grupo é aleatória.
“Os resultados desse estudo acabam não suportando o uso da
hidroxicloroquina nem para prevenção da covid-19, já que não observamos uma
diminuição de risco de desenvolvimento da doença para aqueles indivíduos que
usaram o medicamento como forma profilática, nem tão pouco para o tratamento,
seja na forma mais leve da doença ou nas formas mais graves. Não há uma
diminuição de risco para aqueles indivíduos que usam hidroxicloroquina em
termos de necessidade de hospitalização, ventilação mecânica e até mesmo o
óbito”, pontua Paulo Martins.
A partir da meta-análise, o pesquisador ainda alerta para a observação
de um aumento do risco de eventos adversos diante do uso indiscriminado do
fármaco antimalárico e imunomodulador, especialmente no que se refere a
sintomas gastrointestinais.
Além de Paulo Ricardo Martins Filho, o artigo publicado na revista
científica é assinado por Adriano Antunes de Souza Araújo, Lis Campos Ferreira,
Luana Heimfarth e Lucindo José Quintans Júnior, do Programa de Pós-graduação em
Ciências da Saúde da UFS.
The Lancet Regional Health
The Lancet Regional Health – Americas é uma das revistas do
conjunto de periódicos de iniciativa global da The Lancet para
defender a qualidade e o acesso aos cuidados de saúde em todas as regiões do
mundo. A publicação busca promover o avanço da prática clínica e da política de
saúde nas Américas, a fim de melhorar os resultados de saúde, aspirando ainda
aumentar a qualidade da pesquisa em saúde regional e nacional.
Fonte: UFS